Fonte: Isto É Dinheiro
Para voltar à briga do varejo brasileiro, o Walmart reduz o tamanho dos hipermercados e enxuga a estrutura operacional
Marcos Samaha tinha um compromisso diferente na primeira quarta-feira de 2011. Quatro meses depois de assumir a presidência da subsidiária brasileira do Walmart, Samaha convocou a imprensa para sua primeira entrevista.
Contido nas palavras e cauteloso nas explicações, ele anunciou que, a partir do dia seguinte, todas as bandeiras do grupo adotariam a estratégia batizada de “preço baixo todo dia”. Parecia pouco para quem esperou tanto tempo para ouvir o presidente de uma empresa que fatura R$ 19,7 bilhões por ano.
Não era. Por trás do anúncio está o sinal de que, finalmente, depois de 16 anos no País, o gigante do varejo mundial arrumou a casa e está pronto para entrar no ringue. Do portão para fora, a mudança mais visível é a redução no tamanho dos hipermercados da rede.
A área de venda dos hipermercados, que era em média de 12 mil metros quadrados, foi reduzida à metade. Um encolhimento que pode ser conferido a olho nu. Há dez anos, as lojas tinham entre 40 e 50 caixas registradoras.
Hoje, essa média fica entre 20 e 25, segundo estudo do professor Silvio Laban, do Insper. O próprio Samaha admite que o gigante encolheu. “Sim, está caindo o número de hipermercados e eles estão menores”, disse Samaha à DINHEIRO.
Ele afirma que a redução se deve à dificuldade em encontrar terrenos disponíveis nas grandes cidades. “E, quando se encontra, o preço é absurdamente alto.”
É verdade. Só na Grande São Paulo, o aluguel de galpões comerciais já está sendo negociado na casa dos R$ 20 a R$ 22 o metro quadrado, de acordo com a construtora WTorre. A média de 2010 ficou entre R$ 17 e R$ 18 o metro quadrado, um aumento de 30% em menos de 12 meses.
Reduzir o tamanho dos hipermercados não é, no entanto, prerrogativa da rede americana. O Pão de Açúcar já trabalha com lojas menores e o francês Carrefour, que também aderiu ao formato, vive sob pressão dos principais acionistas lá fora para encolher ainda mais.
Por trás de hipermercados nem tão hiper assim está também uma drástica mudança nos hábitos de consumo dos brasileiros. Nas décadas de 1970 e 1980, quando as lojas de supermercados de grande porte começaram a surgir no Brasil, o propósito era atender consumidores que lotavam os carrinhos. Eram as chamadas compras do mês.
Tudo em grande quantidade para preservar o poder aquisitivo num cenário de inflação galopante. Foi nesse ambiente que o Walmart estreou no Brasil. A estreia coincide com o início da estabilidade econômica.
Exatamente 16 anos depois, nem a inflação nem o cliente são mais os mesmos. “Apenas 40% dos consumidores optam pelo hipermercado na hora de fazer suas compras”, diz Fátima Merlin, diretora de varejo de consumo da Kantar Worldpanel Brasil, uma firma de pesquisa de mercado e hábitos de consumo.
Quando precisam repor algum item na despensa de casa, os clientes preferem o mercadinho da esquina – onde a economia é mais de tempo do que de dinheiro. “As compras de grandes volumes ainda acontecem e para isso existem os chamados atacarejos”, diz Fátima.
O nome estranho batiza um novo formato de loja que oferece preços do atacado, normalmente 20% menores, em lojas que não são exatamente de atacado, onde o cliente compra a quantidade que quiser.
O modelo está tão em alta que atualmente todas as grandes redes do setor têm sua bandeira do gênero: a do Walmart é a Maxxi Atacado, com 51 lojas. “A concorrência hoje vai muito além da briga entre empresas e passa pelos diversos tamanhos de lojas e formas de venda”, afirma Olegário Araújo, gerente nacional de atendimento ao varejo da empresa de pesquisa Nielsen.
Mas se a dinâmica do mercado alterou-se, o Walmart também mudou. Gafes, como oferecer botas de esqui a clientes de um país tropical, são coisa do passado. Do ponto de vista administrativo, o Walmart de 2011 é muito diferente da empresa que se instalou no País em 1995.
A opção de crescer por conta própria mostrou-se insuficiente e os americanos resolveram partir para uma política agressiva de aquisições – especialmente no Nordeste, onde estão 197 das suas 479.
A expansão por meio de compras de redes já estabelecidas aconteceu em todo o País, o que deu musculatura e capilaridade ao Walmart. “O problema é que eles ficaram com a estrutura muito pesada. Chegaram a ter mais de 100 diretores espalhados pelo País”, afirma um alto executivo da indústria de alimentos. “Os processos internos e os sistemas operacionais também não estavam integrados.”
Nesse sentido, o Walmart encolheu. Vicente Trius, o primeiro presidente da filial brasileira, implementou a política de aquisições. Héctor Núñez, o antecessor de Marcos Samaha, se encarregou de integrar as operações e enxugar a estrutura operacional.
É por isso que, só agora, a empresa implanta aqui a estratégia que fez dela a maior varejista do mundo. O conceito de preço baixo todo dia não é uma peça promocional. É um modelo de negócio que envolve os fornecedores dos mais de 60 mil itens vendidos nas lojas.
Por enquanto, a redução média entre 10% e 15% alcança apenas dois mil produtos. Samaha, um obcecado por redução de custo, já teve a experiência de implantar a estratégia quando comandou a operação do Walmart na América Central.
No México, o modelo consumiu alguns anos, mas, depois que foi assimilado pelo consumidor, transformou a marca em uma das mais fortes daquele mercado. O desafio do Walmart é promover uma mudança de cultura no brasileiro que está acostumado a promoções diárias.
“O sucesso da operação depende muito da comunicação. De o consumidor saber que pode voltar amanhã e depois que o preço não vai mudar. Se o Walmart conseguir isso, aí teremos a legítima rede varejista americana brigando como gigante no Brasil”, diz um fornecedor.
quarta-feira, 19 de janeiro de 2011
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